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Linguagem Corporal e o Sistema Nervoso Autônomo

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Tempo de leitura: 4 min.

O senso comum sobre a linguagem corporal, o sistema nervoso e os sinais da mentira sustenta que, a partir dos sinais observados, podemos concluir se alguém está mentindo ou dizendo a verdade. Será que nosso sistema nervoso autônomo é tão confiável assim?

Ao lermos livros sobre linguagem corporal e os sinais da mentira, bem como diversas matérias sobre o tema que estão publicadas na Internet, vemos uma argumentação de que a mentira ativa o Sistema Nervoso Autônomo (SNA).

De forma geral, a literatura sobre linguagem corporal (principalmente a caracterizada como auto-ajuda) sustenta que, a partir dos sinais observados, podemos concluir se alguém está mentindo ou dizendo a verdade. Será que os sinais do SNA são tão confiáveis assim?

A resposta não é tão simples quanto a pergunta e eu diria que uma abordagem adequada envolve, no mínimo, a análise de dois aspectos: (1) A ativação do SNA está ligada exclusivamente à mentira? (2) Estímulos antecedentes diferentes podem eliciar (disparar) a mesma resposta do SNA?

A questão 1 é fácil de responder. Obviamente, não é só a mentira que ativa o SNA.

A questão 2 envolve uma complexidade maior. Os experimentos de Pavlov são bem populares e bastante antigos (conhecido como condicionamento clássico). Em determinadas circunstâncias, estímulos de diversas naturezas (incluindo alguns que eram neutros) podem eliciar respostas do SNA.

 

A partir dessas observações, explicarei melhor como as pessoas andam “simplificando” demais a observação do comportamento não verbal (principalmente a linguagem corporal, as expressões faciais e os gestos) ficando suscetíveis a erros grosseiros de análise.

Vamos começar por algo que chamo de Psicologia 1.0 – Comportamento Respondente.

Esse tipo de comportamento é, em poucas palavras, aquele que aparece imediatamente após um estímulo.

Essa abordagem teórica funciona muito bem quando queremos entender algo organicamente mais primitivo como uma resposta do SNA que é provacada “quase” que imediatamente por nossos hormônios.

O próprio Dr. Ekman sugere que os sinais não verbais, expressões faciais e alguns gestos são “hard wired” (básicos e ligados ao funcionamento do organismo) e por isso seriam tão confiáveis.

O grande problema é que mesmos esses comportamentos podem ser eliciados por estímulos diferentes.

Vejamos o experimento de Pavlov:

1. Comida é apresentada, então o cão saliva;

2. Comida é apresentada junto com a sineta que toca, então o cão saliva;

3. Depois de um tempo de repetição (emparelhamento de estímulos) de 2, toca-se apenas a sineta e o cão saliva.


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Mas que raios a sineta tinha a ver com a saliva? NADA!

 

Esse experimento clássico e muito bem conhecido foi realizado com animais, porém o ser humano também funciona de forma semelhante.

 

Durante a vida, certos estímulos que eram neutros podem ser emparelhados e, uma vez que isso ocorra, passam a eliciar respostas autonômicas (sejam expressões faciais, sejam gestos, sejam náuseas etc). Além disso, se o estímulo está presente no próprio corpo do sujeito, existe a hipótese de feedback facial, segundo a qual o  estímulo e a resposta estabelecem uma relação biunívoca e intercambiável.

É o  caso, por exemplo, das expressões faciais nas quais determinados músculos, quando são contraídos, podem fazer o sujeito experimentar a ativação fisiológica da emoção correspondente ou associada à movimentação daqueles músculos. Generalizando um pouco, esse fenômeno (feedback) nos ajudaria a explicar as “Power Poses” de uma forma muito mais simples do que a utilizada por Amy Cuddy [1], que parece mirabolante, exagerada, senão coisa pior……

É necessário destacar que o raciocínio aqui realizado é uma simplificação da multiplicidade dos processos envolvidos, mas serve para explicar fenômenos psicológicos quando o estimulo e a resposta fazem parte do corpo do mesmo sujeito. como, por exemplo, vinculações entre movimentos musculares e a componente fisiológica das emoções (power poses, por exemplo).

 

Nessa postagem simplificamos bastante o raciocínio, que provem de teoria muito robusta e que já tem mais de um século de experimentos científicos e de prática clínica para sustentá-lo. Na psicologia clínica, é utilizado para explicar alguns casos de Síndrome do Pânico, por exemplo.

 

Esse raciocínio também serve para demonstramos que não dá para ver alguém gaguejar, ou ficar vermelho, ou coçar o nariz, ou esfregar a mão no corpo, ou encolher-se, ou muitos outros sinais e já ir dizendo que a pessoa está mentindo. Só por que o SNA foi ativado.

 

Como a linguagem corporal e o Sistema Nervoso Autônomo me ajudam a pegar a mentira?

A observação dos sinais visíveis de ativação do SNA é muito válida para a identificação da mentira. Nossa argumentação é de que essa observação deve ser feita com técnica e cuidado. Veja um artigo nosso intitulado “Não Existe um Único e Definitivo Sinal da Mentira

Em outro artigo trataremos da linguagem corporal e o Sistema Nervoso Autônomo, explicando o condicionamento operante, que também pode influir no estabelecimento do nosso comportamento. Antes de terminarmos, é importante ressaltar que estamos analisando apenas os processos conhecidos como básicos. Se a isso acrescentarmos os processos superiores e que nos caracterizam como humanos, as interpretações podem ficar ainda mais complexas.

Outro alerta importante diz respeito à forma como os analistas do IBRALC interpretam a linguagem corporal. Procuramos considerar que os processos básicos (comuns a todos os animais) e os processos superiores (aqueles que nos caracterizam como humanos) compõem, de forma sistêmica, o nosso psiquismo e que não há, necessariamente, uma hierarquia entre eles.

 Esse aviso é importante, pois há abordagens que consideram que, já que somos humanos, os processos superiores se sobrepõem aos básicos (o que não se verifica na prática). Começamos pela explicação da influência dos processos básicos, mas consideramos tudo em nossas análises concretas.

A interpretação do comportamento não verbal não admite conclusões apressadas com base em poucos indicadores, então cuidado com julgamentos apressados e baseados em poucas observações e em pouco conhecimento sobre o assunto.

Veja mais sobre o comportamento respondente (em inglês)

Um abraço

Sergio Senna

 

Referências

 

[1] Carney, D. R., Cuddy, A. J. C., & Yap, A. J. (2010). Power Posing. Psychological Science, 21(10), 1363–1368. 

 


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Como citar este artigo?

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PIRES, Sergio Fernandes Senna. Linguagem Corporal e o Sistema Nervoso Autônomo. Instituto Brasileiro de Linguagem Emocional. Disponível em < https://ibralc.com.br/linguagem-corporal-sistema-nervoso/> . Acesso em 28 Mar 2024.

Formato Documento Eletrônico (APA)

Pires, Sergio Fernandes Senna. (2012). Linguagem Corporal e o Sistema Nervoso Autônomo. Instituto Brasileiro de Linguagem Emocional. Recuperado em 28 Mar 2024, de https://ibralc.com.br/linguagem-corporal-sistema-nervoso/.

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